sexta-feira, 5 de outubro de 2007

Sinto o Cinto

Estou parado no sinal. O trânsito está horrível. Clima típico do Rio de Janeiro, seco e quente. Em meio a buzinas e ronco de motores, mantenho minha normal tranquilidade, ouvindo um louvor (sempre um louvor) no rádio do carro.

De repente me sinto incomodado, angustiado. O cinto de segurança incomoda, aperta demais. O volume do rádio fica mais baixo, até o ponto em que não consigo mais ouví-lo. "O cinto está incomodando", penso, sabendo que não posso tirá-lo pois a lei não permite. Percebo que minhas duas mãos estão no volante, mais um ponto para o bom motorista. Mas percebo também que algo está errado. Alguma coisa angustiante, sufocante, uma sensação repentina de tristeza, de agonia. O cinto está apertando de verdade, sinto pressão contra o peito. Olho em volta mas as pessoas não me notam, cada um preocupado com seu próprio mundo, olhando atentamente o semáforo que teima em mostrar sua luz vermelha. Tento afrouxar o cinto, puxando-o com a mão, mas a pressão contra o banco é tamanha que não consigo sequer encaixar o polegar entre o cinto e meu peito. Tento soltar a trava, mas pressiono em vão o botão.

Quando o cinto começa a cortar minha carne por debaixo da roupa, percebo que não tenho mais espaço para respirar. É como se algo ou alguém puxasse o cinto com todas as suas forças. O suor escorre pelo meu rosto e somente pequenas arfadas puxam pra dentro o ar que já não é suficiente pra alimentar o corpo, e a cabeça dói como se estivesse no alto da serra, contrariando a sensação de fundo do mar que meus pulmões sentem. Dor, muita dor, e mais nenhum espaço pra me debater ou fôlego pra pedir socorro. Apenas uma pequena frase, quase inaudível, sai dos meus lábios: "sai... em nome... de Jesus!"

Repentinamente o cinto se afrouxa e todo o meu corpo é jogado pra frente. Meus ouvidos voltam a ouvir o som vindo dos pequenos auto-falantes quando percebo que o sinal abriu e os carros começaram a andar. Minha cabeça bateu de encontro ao volante devido à força que fiz para me livrar daquela amarra, mas não é mais dor que sinto. Agora é o alívio que me preenche, junto com uma Paz que excede a todo entendimento.

Tudo poderia não ter passado de um sonho, se não fosse aquela marca no meu peito. Engato a primeira marcha e saio com o carro, sob o protesto dos motoristas atrás de mim, certo de que venci mais uma batalha.

Esta é uma obra de ficção. Qualquer semelhança com a realidade é real. Não existem coincidências no mundo espiritual.

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